Farol de Mosqueiro

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quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Mosqueiro: a história de um arquipélago singular no estuário Amazônico (Parte I)

Flor das Águas, foi desta forma que o geógrafo e estudioso da Amazônia, Eidorfe Moreira, encontrou para denominar Belém, capital do estado do Pará e primeira cidade a ser fundada na Amazônia. Para ele, não é exagero dizer que nenhuma outra cidade do Brasil se mostra tão portentosa e interessante sob o ponto de vista hidrográfico. A água figura aí como peça fisiográfica e como elemento cênico, como moldura e como agente modelador. Podemos dizer que é um privilégio uma cidade possuir em seu território tantas ilhas, baías, rios, igarapés e praias. E é certamente o arquipélago do Mosqueiro, o maior de todos, o que mais expressa o caráter de uma cidade constantemente penetrada e fecundada pelas águas amazônicas.

A história de Mosqueiro se confunde com a história da colonização da Amazônia, particularmente do estado do Pará e sua capital. É a história de um arquipélago singular, localizado no magnífico delta do rio Amazonas que vem encantando os viajantes durante séculos.

A verificação de mapas do século XVII, produzidos pelos primeiros navegadores europeus a visitar a região, aponta para dois aspectos interessantes do ponto de vista histórico para o arquipélago do Mosqueiro. O primeiro é a denominação de Ilha de Santo Antônio e o segundo é o fato da região estar inserida na Província dos Tupinambás. Esses povos habitavam o estuário amazônico por ocasião da chegada do colonizador. Suas tradições estavam intimamente ligadas à natureza, a partir dela elaborou tecnologias e teologias. Foi uma sociedade que experimentou um modo de vida fortemente relacionado com a floresta, com os rios, com os minerais e com as espécies da fauna e da flora, deixando suas marcas na cultura dos paraenses.


Em janeiro de 1.500, o navegador espanhol Vicente Iañes Pinzón chega à costa norte brasileira e depara-se em meio a um grande mar de águas doces, turvas e esbranquiçadas, região que mais tarde ele irá denominar de Santa Maria de la Mar Dulce. Encantado pelo formoso delta, Pinzón desembarcou na praia de uma aprazível ilha onde permaneceu o tempo necessário para continuar a viagem, fazendo parte deste maravilhoso arquipélago e guardando as suas belas praias com ondas de água doce, estava uma ilha que, futuramente, receberá o nome de Mosqueiro.

Em 1545, o explorador espanhol Francisco Orelhana, que já havia passado pelo delta do grande rio em 1542 e espalhando pelo velho mundo a notícia de haver encontrado guerreiras para as quais denominou de Amazonas, retorna à região. Partindo de Sevilha, Orelhana avista a terra reconhecendo o cabo de São Roque, percorrendo mais umas cem léguas, afastados doze da terra, os navegantes encontram água doce, era o sinal que seu comandante buscava para saber que havia retornado ao delta do rio das Amazonas. No dia seguinte, chegaram em uma baía localizada entre duas ilhas abundantes de frutas e pescado. O historiador João Lúcio D’Azevedo, comentando este episódio, escreve “... no dia seguinte ao que penetraram no rio, deram fundo entre duas ilhas bastante povoadas: pode-se supor fosse a baía do Sol, perto das ilhas de Colares e Mosqueiro. Na véspera, quase se perdem nos baixos: devia ser os de Bragança. Tudo isto a simples inspeção do mapa nos confirma”. D’Azevedo também comenta, baseado em relato do Frei Gaspar de Carvajal, que este dia era consagrado à Nossa Senhora do Ó, aquela que mais tarde tornaria-se padroeira de Mosqueiro.

Partindo da baía de São Marcos, no dia 25 de dezembro de 1615, a expedição de Caldeira Castelo Branco tinha o propósito de avançar para o norte o processo colonizador. Após alguns dias de viagem, a expedição chega defronte da entrada da atual cidade da Vigia. Dando prosseguimento a sua viagem, os navegadores atravessam a baía do Sol e a ilha de mesmo nome, hoje conhecida como ilha de Colares. Em relato feito para o rei D. João V pelo funcionário da Coroa Bernardo Pereira Berredo, neste momento, deparam-se com uma região considerada o lugar mais apropriado para a conquista e povoação e “um dos mais agradáveis lugares desta Costa para fundar uma cidade” segundo o padre José de Morais, e acrescenta em seguida, “a não serem seus mares tão inquietos que faziam dificultoso o desembarque das naus do reino e embarcações da terra, por ser açoutada toda aquela Costa das grandes maresias da tarde, algumas vezes com trovoadas”. No dia seguinte, Caldeira subiu um pouco mais, assentando a nova povoação em uma península à direita do rio Guamá. Estava fundada Belém, em 12 de janeiro de 1616. A falta de precisão dos documentos relativos à expedição de Caldeira Castelo Branco não nos permite ter convicção de que o lugar ao qual se refere Berredo é Mosqueiro, todavia as circunstâncias de viagem e a descrição que o padre José de Morais faz da região, guardando enorme semelhança com a enseada da ilha voltada para a baía do Sol, reforça esta ideia.

Nos primeiros séculos de colonização portuguesa, o litoral era responsável pelo abastecimento do núcleo colonizador. Não demorou muito para os jesuítas instalarem na ilha do Mosqueiro a Missão Myribira que, juntamente com a Missão Topinambazes, na ilha de Colares, e outras do mesmo gênero constituíam as Aldeias de Baixo. A estratégia desenvolvida pelos jesuítas foi fundamental para o sucesso do aparato colonizador em seus momentos iniciais. Administravam recursos que serviam para o pagamento de dotes para aqueles colonos que casassem com nativas da região. Através de suas aldeias garantiam a mão de obra necessária para a construção do núcleo urbano, bem como para a exploração das drogas do sertão.

Ao ser nomeado pelo rei de Portugal, D José I, como Secretário de Negócios Estrangeiros e de Guerra, o Marquês de Pombal inicia um processo de mudanças na política do governo português que resultaram em grandes transformações na região. Em 1751, cria o Estado do Grão-Pará e Maranhão e transfere a sede do governo para Belém. Seu meio irmão Francisco Xavier Mendonça Furtado é nomeado governador. Furtado estabelece, em 1757, normas que instituíam o cargo de diretor de aldeia, nomeado pelo governador. Contrários às novas diretrizes do governo, os jesuítas são expulsos do Pará por ordem do Marquês de Pombal.
No século XVIII, muitas pessoas requereram enormes áreas de terras em Mosqueiro, as léguas de “sesmarias” como eram chamados os documentos que doavam as terras pertencentes à Província Imperial. Entre estes beneficiados estava o posseiro Padre Antônio Nunes da Silva a quem coube a doação das terras de Mosqueiro voltadas para a Baía do Sol, em 6 de dezembro de 1746. Contando com a mão de obra de escravos africanos, seus herdeiros construíram sítios agrícolas: o Sítio Conceição, ainda preservado; o Sítio Santana, onde as ruínas de sua casa grande encontram-se na propriedade do Hotel Paraíso; e o Sítio Paysandu, na foz do rio Sucurijuquara.


          Na primeira metade do século XIX, o Pará vivenciou a revolta dos Cabanos, assim nomeada por fazer referência às habitações daqueles que formavam os maiores contingentes que integraram o movimento. Faziam parte deste, camadas sociais desfavorecidas como  caboclos, índios destribalizados e os negros libertos que moravam nas ilhas e regiões próximas a Belém, além de alguns fazendeiros e comerciantes inconformados com a política do presidente da província.
No litoral de Mosqueiro, importante reduto Cabano, havia dois pontos artilhados: o da Vila, instalado nas barrancas da praia do Bispo; e o do Chapéu Virado, com artilharia montada nos penedos que ali existiam. Eram desses pontos que os Cabanos atingiam os navios que conduziam tropas, mantimentos, armas, munições e fardamento para o marechal Manuel Jorge Rodrigues na ilha de Tatuoca e para as tropas de Pernambuco que haviam aportado na ilha de Cotijuba. A resistência instalada na ilha do Mosqueiro enfrentou as forças legalistas em 21 de janeiro de 1836, em plena praia do Chapéu Virado. Após horas de combate, várias mortos e feridos de ambos os lados e sem munição, os Cabanos saíram em retirada pelas matas e rios da região.


Nas décadas seguintes à Cabanagem, Mosqueiro continuava com sítios agrícolas, concentrados em sua maioria no norte do arquipélago, e um pequeno vilarejo ao sudoeste com suas casas localizadas, entre arvoredos, na beira da baía. Politicamente, Mosqueiro era vinculado à Freguesia de Benfica e em seu território os mapas apontavam diversos vilarejos: a Vila da Baía do Sol, ao norte; a Vila do Carananduba, a noroeste; a Vila do Chapéu Virado, a oeste e a Vila do Mosqueiro, a sudoeste.

Quando vice-presidente da Província do Pará, o Cônego Manoel José de Siqueira Mendes sancionou, em 10 de outubro de 1868, a lei 563 da Assembleia Provincial criando a Freguesia do Mosqueiro. Em seu artigo 1º lemos “Fica criada na povoação de Mosqueiro uma freguesia sob a invocação de Nossa Senhora do Ó...”. A igreja que havia no vilarejo de Mosqueiro e pertencia à Irmandade de Nossa Senhora do Ó, foi indicada para matriz provisória e mandada avaliar para a devida indenização à irmandade, promovendo-se a sua conclusão pelo governo da Província, o mesmo ocorrendo com a obra do cemitério que ficava ao lado da capela e pertencia à mesma irmandade. O fato da sede da nova Freguesia ter sido instalado no vilarejo de Mosqueiro determinou o nome da mesma.

D. Macedo Costa era então o bispo do Pará e nessa qualidade designou em portaria de 2 de abril de 1869, para vigário da nova freguesia, o padre de cinquenta e um anos, Manoel Antônio Rayol, que aceitou e nela se radicou.

O século XIX chegava às suas últimas décadas, Mosqueiro deixaria de ser Freguesia e passaria para a condição de Vila de Belém em 6 de julho de 1895. A região começava a experimentar um novo ciclo econômico que traria grandes transformações. Para Mosqueiro estavam reservadas muitas surpresas. Porém, este será o tema da segunda parte desta história a ser veiculada no Blog mosqueirosustentavel.blogspot.com. 

Editorial

A relação com Mosqueiro surgiu muito cedo em minha vida. Quando nasci, meus pais já frequentavam a Ilha e meus avós eram pessoas encantadas por suas belezas e mistérios, frequentando suas belas praias e recantos bucólicos com assiduidade.

Minha mãe é filha de Cláudio Baião Cardoso e neta de Francisco Xavier Cardoso. Acometido de doença no pulmão, meu bisavô Francisco recebeu a recomendação de mudar para Mosqueiro, pois o clima da Ilha faria bem para a sua saúde. Viúvo e acompanhado dos dois filhos, Francisco instalou na rua Pratiquara a farmácia Cardoso, exercendo também as funções de “juiz de paz” e de parteiro. Não demorou muito para encontrar D. Xiquinha, casar com ela, ampliar a família e criar raízes definitivas em Mosqueiro. Meu avô, Cláudio, passou parte de sua infância e adolescência em Mosqueiro e frequentou os bancos escolares do colégio “Inglês e Souza”.

Minha bisavó Sinhazinha, mãe do meu avô Lauro, enfrentava as águas da região e de barco, juntamente com familiares e amigos, ia passar férias no sítio Conceição, localizado no litoral de Mosqueiro banhado pela baía do Sol. Meus avós paternos, sempre que podiam, embarcavam nos navios que faziam linha para Mosqueiro e iam desfrutar de seus encantos. Como não tinham casa na Ilha, frequentavam o Hotel do Zacarias, no Farol, onde dispunham de um apartamento cativo. Meu pai, ainda criança, contava com uma pequena canoa de madeira para descobrir os primeiros mistérios daquelas águas. Quando não iam para o Hotel do Zacarias, levavam a família para casas de amigos que, gentilmente, cediam suas residências. Uma delas era o chalé “Minhoto”, localizado na praia do Chapéu Virado e de propriedade do tio Deusdeth e da tia Eunice a outra era a casa do tio Domingos e da tia Nilza, localizada na passagem Luís Clementino.

Casado com minha mãe, meu pai que já era frequentador assíduo daquelas praias, adquiriu terreno na passagem Luís Clementino onde construiu sua casa, certamente a realização de um sonho de infância, eu tinha oito anos e minha irmã Mônica quatro. Nossa casa foi a primeira a ser construída naquele lado da rua, uma pequena clareira foi aberta e nela lançada suas fundações. Nesta ocasião, o Dr. Egídio Sales e sua esposa Ivete também construíam sua casa, na esquina da mesma rua. Desta forma, foi muito cedo que comecei a descobrir os encantos de Mosqueiro e não mais deixei de frequenta-la. Mais tarde, de posse de algumas “ferramentas acadêmicas” pude desvendar novos encantos e interpretar as relações entre as pessoas e destas com o ambiente, na Ilha.

ideia de publicar o Blog Mosqueiro Pará Brasil decorreu de alguns fatores. O primeiro deles foi a necessidade frequente que alguns alunos têm demonstrado quando da realização de seus trabalhos escolares, trabalhos de conclusão de curso, monografias de especialização e dissertações de mestrado, todos versando sobre aspectos diversos da ilha do Mosqueiro. Outro fator foi a quantidade razoável de trabalhos já realizados suscitando a necessidade de reunir essas informações em um único espaço. Finalmente, a minha intenção em contribuir com uma reflexão a respeito do significado de um plano capaz de promover o desenvolvimento integrado e sustentável da Ilha garantindo a melhoria na qualidade de vida de seus moradores e a satisfação de seus visitantes.

Nele disponibilizo informações sobre sua história, a valorização da cultura local, propostas referentes ao desenvolvimento local, denúncias, fotos, vídeos, dentre outros. Sempre haverá espaço para as pessoas se manifestarem enviando suas contribuições para o e-mail: edujcbrandao@gmail.com que serão publicadas após passar por um conselho que irá avaliar a coerência com a sua linha editorial do Blog.

Se você se sente comprometido em fazer por Mosqueiro e não de se fazer com Mosqueiro, participe. Todos serão sempre bem vindos.