Farol de Mosqueiro

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quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

A família Silva e as terras da Baía do Sol em Mosqueiro.

(Ilustração de D'Arcy Albuquerque)

Ao receber da família real portuguesa, poderes para interferir na política colonial no Brasil, o Marquês de Pombal expulsou os jesuítas, proibiu a escravidão dos índios e estimulou a vinda de negros de Angola e Guiné preconizando a exploração do negro africano. Decorrente desta política, em várias regiões da Ilha do Mosqueiro, algumas famílias foram beneficiadas com concessões de lotes de escravos africanos e terrenos onde construíram sítios agrícolas.

As “Sesmarias” eram um ato régio que dividia o Brasil em capitanias hereditárias. Este ato regulava a concessão de terras feitas aos colonos assentando o processo legal de aquisição, os direitos e deveres de donatários e posseiros. Esse processo era feito nos Foros das capitanias, dando aos donatários o direito de concederem sesmarias, segundo as leis do reino, aos que requisitassem. Sendo cristãos, não ficavam obrigados a pagar tributos.

O requerente recebia informações do Provedor da Fazenda Real, da Câmara Municipal e do procurador da Coroa indo depois ao despacho final. No caso de deferimento, o secretário de estado lavrava a “Carta de Data e Sesmaria” que era assinada pela autoridade superior. Esse documento vedava o traspasse por qualquer meio, a nenhum tempo, à pessoa alguma, religião ou comunidade, sem que fosse feita a comunicação ao Provedor Mor da Fazenda. Este era obrigado a submeter o assunto ao juízo do governador. As terras eram concedidas de modo que o concessionário as tivesse como uso próprio, para ele e seus herdeiros, ascendentes e descendentes, sem pensão nem tributo, a não ser o dízimo a Deus dos frutos que houvesse e lavrasse na terra.

A carta de doação da Baía do Sol coube a um posseiro, o Padre Antônio Nunes da Silva, datada do dia 06 de dezembro de 1746, escrita por Mathias de Albuquerque, oficial da Secretaria de Estado, e assinada por João de Abreu Castelo Branco, Provedor da Fazenda Real. A transcrição deste documento foi publicada no trabalho de Conclusão de Curso da então aluna do curso de história da Universidade federal do Pará, Maria Beatriz Pacheco Mendes (1999) e reproduzia em seguida:

Registro de uma Carta data de sobra de terras concedidas ao padre Antônio Nunes da Silva.

João de Abreu Castelo Branco, façam saber dos que esta “Carta de Data e Sesmarias”, virem que o Padre Antônio Nunes da Silva, morador desta cidade me representou que ele não tinha terras próprias em que pudesse cultivar suas lavouras tendo possibilidade para fazer e por que na Baía do sol se achavam algumas devolutas principalmente umas sobras de terras que estão entre os marcos do pai do suplicante Simão Nunes, e violantes de quadras que será légua e meia pouco mais ou menos, principiando dos marcos do dito seu pai correndo para a parte da costa do dito seu pai, digo correndo para da costa da dita Baía do Sol. Para a barra de Tauaryê quase até os marcos da dita violante de quadras com uma légua de centro ao que atendendo a informação do Provedor da Fazenda real a quem se deu vista e se em utilidade da mesma e fazendo cultivarem-se neste Estado. Hey por bem conceder-lhe com o nome de sua majestade por “Data Semarias” as ditas sobras de terras com légua e meia de comprido somente e uma légua de centro na forma e parte que pede na paragem mencionada com as confrontações declaradas e condições “Expressas nas Reais Ordens” e condições a de não fazer transpasso por meio algum em nenhum tempo e pessoa alguma religião ou comunidade sem que primeiro dê parte na “Casa da Fazenda do Provedor” dela para se me fazer presente ou se deve ou não consistir ou não tal tranpasso sob pena de ficar nula esta Data e poder conceder a outrem a nesta forma se lhe passa  “Carta Data” para que o dito Padre Atônio Nunes da Silva haja e logre a pessoa as ditas terras como coisa sua e própria para que ele e todos os seus herdeiros, ascendentes e descendentes sem pensão e nem tributo algum mais que o dízimo a deus dos frutos que nela tiveram lavrar a qual concessão lhe faço não prejudicando há terceiros nem há sua majestade se no dito sitio quiser mandar fundar alguma vila reservando os “Paus reais” que nelas houver para embarcações com declaração que mandará e confirmará esta. Há por sua majestade dentro dos três anos seguintes e cultivar as ditas terras de maneira que dêem frutos e dará caminhos públicos e particulares onde forem necessários para fortes, pontes, portos e pedreiras e havendo no sítio pedido navegável que necessite de canoa ou barca para a sua passagem ficar livre uma margem que toca as terras do suplicante meia légua de terra para uso público e se demarcará ao tempo da posse por rumo de cordas e braças, craveiras como era de estilo e sua majestade manda e outro assim não poderiam suceder nelas religião nem outras pessoas eclesiástica por qualquer título que seja e acontecendo se necessário terá como encargo de pagarem delas dízimos a deus como se fossem possuídas por seculares e faltando a qualquer destas cláusulas se haverão as terras por devolutas e se deram a quem as denunciar como o dito senhor ordena. Pelo que mando ao “Provedor mor da Paz Real” mais ministros e pessoas a quem tocar que na forma referida e com condições expressadas deixem ter e possuir as ditas terras como coisa sua própria para ele e todos os seus herdeiros, ascendentes e descendentes comprem e guardem esta minha “Carta de data” tão inteiramente como nela só contem a qual lhe mandei passar para mim assinada e selada com o sinete de minhas armas que se registrará onde se tocar e se passasse por duas vias dada na cidade de Belém do pará aos seis dias do mês de dezembro ano do nascimento de nosso Senhor Jesus Cristo de mil e setecentos e quarenta e seis. Eu Mathias Paz de Albuquerque que oficial da Secretaria do Estado a fiz // João de Abreu de Castelo Branco.“ Belém – Pará 06/12/1746. (Arquivo Público do Pará – Fotog. 538/39 – Liv. 12. Rolo 24)


Conforme se pode observar na transcrição acima, a Baía do Sol teve sua colonização muito antes do Padre Antônio Nunes da Silva. Tratava-se de Simão Nunes, pai dele que ali fizera o seu pequeno povoamento com ajuda dos nativos. Neste período a utilização da mão de obra do escravo negro ainda era muito restrita.

 A família Silva foi determinante na formação do povoamento da Baía do Sol desde os primeiros anos do século XVIII até os dias de hoje. Essa família ainda é numerosa nessa região de Mosqueiro apesar da entrada de outras famílias. A fusão dessas famílias, hoje, originou grande entrelaçamento étnico.

Como vimos anteriormente, o primeiro silva foi Simão Nunes Silva, depois seu filho Antônio Nunes da Silva. Daí para frente há um grande questionamento quanto aos demais Silva. Não é confirmado se os que surgiram dessa terceira geração são filhos do padre ou primos, que herdaram as terras de Santana (atual Fazendinha).

Tomaz da Silva e Izabel tomaram posse de Santana, seus herdeiros foram seus quatro filhos: Fernando, Jorge, Leocádio e Tomaz Filho. Para cada filho ficou uma determinada porção de terra. Todos tinham escravos sob seus domínios. Desse modo, a Baía do Sol foi assim dividida: ao Fernando, coube o sítio Paraíso; ao Jorge, o Sítio Paissandu; a Leocádio, o sítio Conceição; e a Tomaz Filho, as áreas de terra da Fazenda (Fazendinha). O sítio Conceição ainda existe nas mãos do Silva, os demais foram passados ou vendidos a terceiros:

“Dessa família Silva, irradiou-se quase totalmente, a propriedade dessa imensa área que domina a face oriental da ilha do Mosqueiro, ou seja a Baía do sol em frente a ilha de Colares, antiga “ilha do Sol”. Em verdade, os ancestrais dessa gente constituíam-se três irmãos: Fernando, Jorge e Leocádio. Seus herdeiros, através dos anos, prosseguiram vivendo naquelas terras e em virtude de enlaces com outra famílias, o “Paraíso” passou para as mãos dos Travassos, o Paissandu aos Pamplona (gente emigrado do Marajó). Houve um quarto “Silva” chamado Tomaz, irmão de Leocádio, que se instalou no extremo oriente, filhos de Leocádio e de Dona Isabel, e que foram os fundadores da “Fazenda Paissandu” (MEIRA FILHO, 1976)


Ana Silva, filha do herdeiro do sítio Paraíso, Fernando Silva, casa com o português José Travassos. Este enlace matrimonial irá determinar que a propriedade passasse a ser administrada pela família Travassos. Durante muito tempo o sítio Paraíso serviu como retiro para os estudantes primários do colégio Santo Afonso, o qual tinha a família Travassos como mantenedora. Embora o sítio tenha se tornado conhecido por muitos como a residência dos Travassos, devemos reconhecer em seus descendentes a presença da carga genética dos Silva.

(Foto: Antônio Carlos Lobo Soares)

O sítio Conceição foi construído pelo capitão da Guarda Imperial Leocádio José da Silva, junto com sua esposa Maria do Carmo Silva. Recebeu esta denominação em virtude da grande devoção que a família tinha por Nossa Senhora da Conceição. Em 10 de janeiro de 1885 a capela erguida no local para veneração da padroeira foi abençoada pelo padre Castilho, vigário de Benevides, por ordem de Dom Macedo Costa. Hoje a propriedade é mantida nas linhas originais pelo bisneto do casal. Das mesma forma que nos demais Sítios, nele existiram escravos que, com o final da escravatura, muitos deles continuaram trabalhando nestas propriedades.


A história do Sítio acompanha uma geração de mais de duzentos anos composta por imigrantes portugueses, índios e escravos negros que eram serviçais naquelas propriedades. Dessa formação familiar descendem os Silva da Baía do Sol.  Segundo relatos, era tradição dos senhores de escravos, antes de morrer, adotarem os escravos ou serviçais como filhos ou afilhados por batismo. E às vezes, por serem filhos dos senhores com as escravas, colocavam o seu sobrenome para que pudessem herdar alguma coisa após a sua morte. A existência de muitas pessoas negras com sobrenome Silva advém desta interligação.

Esta família constituía os latifundiários da época naquela região de Mosqueiro. Era dona de escravos e tinha grande poder social e econômico. Nas suas terras havia muitas plantações de pimenta-do-reino, roçados, hortas, criação de animais e muitos criados ou serviçais. Relatos referem-se à existência de senzala, hoje destruída, o que supõe um período de escravidão.


Hoje, o casarão do sítio Paraíso encontrasse na propriedade do Paraíso Praia Hotel e Resort. A região tornou-se muito procurada por turistas que buscam praias em Mosqueiro com características ainda bucólicas, este ainda é o caso da praia do Paraíso. Sabemos que novos usos são dados a esses territórios, porém, mais do que nunca, reconhecemos a importância de ações no sentido de preservar a memória do lugar. Em breve estaremos contando um pouco mais sobre os Sítios construído pelos Silvas.

4 comentários:

  1. Prof. Eduardo Brandão muito bom o seu artigo sobre a história do povoamento da Baia do Sol.Parabéns pelo seu blog, realmente muito bom!

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  2. Prof. Eduardo Brandão ... gostei muito do seu artigo meu avo foi um Silva da baia do sol... mais sabia muito pouco sobre a historia das pessoas desta região mais especifica da fazendinha obrigado !!!

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  3. Prof. Eduardo Brandão muito bom seu artigo.. sou neto de um dos Silva da baia do sol.... sabia muito pouco sobre as pessoas e costumes da fazendinha obrigado pelo artigo

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